Esse vinho tem passagem por barricas? Sim, não? Quanto tempo? Você, com certeza, já deve ter se feito essas perguntas ou ouviu alguém fazê-las ao degustar um vinho. Mas, o que é um vinho amadeirado, e qual é a influência que a madeira exerce na bebida?
Bom, pra início de conversa vale ressaltar que nem todos os vinhos, durante sua elaboração, passam por barricas. Tudo vai depender do estilo que o enólogo quer dar àquele produto, seja um vinho branco ou um tinto. Se o profissional desejar mais complexidade, é fundamental que opte pela passagem por barricas. Por isso, praticamente todos os grandes tintos do mundo têm algum tipo de contato com madeira. Mas não só, muitos vinhos brancos e espumantes também passam períodos amadurecendo dentro desses recipientes. Vinhos frutados e frescos, por exemplo, em que a indicação sugere que eles sejam consumidos ainda jovens, o período de maturação em barricas de carvalho não é necessário. O mesmo se pode dizer dos brancos aromáticos, alguns tipos de rosé, que normalmente não passam por esse processo. Vinhos mais básicos e de menor custo também não passam por carvalho por questões econômicas, já que a maturação em barricas pode dobrar o valor do produto final – só para termos uma ideia, uma barrica de 220 litros (a mais venda no Brasil pela Seguin Moreau, uma das maiores tonelarias do mundo) de carvalho americano custa, no Brasil, de 3 a 4 mil reais. Já uma de carvalho francês de R$ 4.700 a R$ 7 mil.
A influência da madeira no vinho é um tema interessante. E quando se fala em madeira logo lembramos do Carvalho - 90% da madeira utilizada no vinho é essa, sendo que a francesa é a dominante - mas há outros tipos utilizados na vinicultura, como a Cerejeira e a Acácia, por exemplo, como explica Rodrigo Perez Nambrard, responsável comercial para o mercado Brasil da Seguin Moreau, uma das maiores tonelarias do mundo (a empresa está presente em todas as regiões vinícolas do mundo e atende a 4500 clientes. São 75 mil barricas fabricadas por ano em três locais de produção: França, em Cognac e Borgonha, e nos Estados Unidos em Napa). É que o Carvalho é o tipo de madeira mais utilizado por enólogos do mundo inteiro. Isso porque apresenta traços aromáticos suaves, o que acaba enaltecendo as qualidades do vinho.
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A utilização de barricas de madeira durante o processo de elaboração pode ocorrer tanto durante as fermentações alcoólica e malolática ou processo de maturação do vinho. É na maturação que as barricas têm o poder de agregar características positivas que arredondam o vinho. “Os benefícios da barrica ao vinho são muitos, e boa parte deles desconhecidos do consumidor. Quando ouço “vinho mais amadeirado ou menos amadeirado” fico, de certa forma triste, pois a função da barrica deve ser apenas de complementar estrutura, sabor e aroma do vinho e não substitui-los”, destaca o enólogo e proprietário da Vinícola Peculiare, Ronaldo Zorzi – os vinhos da vinícola estão entre os mais pontuados no guia de vinhos a seguir. Zorzi ainda explica que, além dos atributos acima, a barrica proporciona ao vinho longevidade, profundidade, persistência e elegância. “O processo de maturação do vinho na barrica inicia ainda no vinhedo, ou seja, não é simplesmente elaborar um vinho para estagiar em barrica, a uva deve lhe permitir isso. De maneira geral a graduação alcoólica, ph e polifenóis são determinantes para tomada dessa decisão.”, pontua o enólogo.
De acordo com Rodrigo Perez Nambrard, a tendência é que cada vez mais a madeira respeite a expressão do vinho. “O carvalho é um complemento do vinho. Deve haver equilíbrio, assim teremos um produto harmônico, elegante, onde a fruta está presente”, explica.
Sobre o Carvalho
Existem mais de 250 espécies de carvalho. No entanto, as mais utilizadas na fabricação de barricas para vinhos são Quercus Sessiliflora ou Quercus Petraea e Quercus Robur ou Quercus Pedunculata, conhecidos como carvalho francês (também é possível encontrar bons carvalhos para a fabricação de barris na Hungria, na Romênia, na Rússia, na Polônia e na Eslavônia, região da Croácia) ou Quercus alba, também chamado de “carvalho americano. Uma diferença significativa entre os carvalhos francês e americano é a sua estrutura celular. O americano é mais denso e mais impermeável, por isso pode ser serrado. Já o francês precisa necessariamente ser partido, sem o uso de serras, a fim de manter os veios naturais da planta sem o risco de futuros vazamentos ao barril a que dê origem.
A França é considerada a melhor fonte de carvalho na Europa. O país é referência, e isso se dá, provavelmente, porque lá estão as maiores e mais variadas reservas. Os barris feitos de carvalho francês conferem tons de feno, tabaco e especiarias ao aroma e uma adstringência moderada ao vinho. A madeira retirada da espécie Quercus petraea apresenta baixa quantidade de taninos, o que gera um sabor mais aveludado, se comparada aos vinhos maturados em madeira da espécie Quercus Robur. Em geral, esses barris dão ao vinho uma textura mais marcante. A granulosidade dessa madeira e a baixa porosidade dela também promovem uma micro-oxigenação mais lenta, o que dá mais longevidade à bebida. Na França, nenhuma árvore é considerada apta para a indústria tanoeira antes de completar 150 anos de idade. Essa padronização e a fiscalização têm relação direta com a boa fama do “carvalho francês”, pois a estrutura granular e a qualidade dos compostos fenólicos estão garantidas. Os recipientes fabricados com madeira norte-americana são reconhecidos pelo poder aromático. Geralmente, eles agregam notas adocicadas como coco e baunilha. Quando a tosta se dá em temperaturas muito altas, essas notas doces e frutadas dão lugar a traços de açúcar mascavo, caramelo e xarope de bordo.
Maturação
A maturação em barricas de carvalho influencia significativamente a composição química e o perfil sensorial do vinho, por permitir sua oxidação controlada, bem como a passagem de compostos aromáticos da madeira ao mesmo. Essa influência é dependente de um grande número de variáveis. O grau de tostagem da barrica é uma das principais variáveis a influenciar a composição química e o perfil sensorial. A tosta é parte do processo de fabricação de barris e tem relação direta com o sabor do vinho que passará pelo recipiente. Existem três níveis: leve, média e forte. Barris de tosta leve são usados por enólogos que buscam o caráter mais natural do carvalho. As de tosta média, muito utilizado para os tintos, e tosta forte tem caráter defumado-carbonizado e normalmente é usada em assemblages.
Quanto menor for o recipiente, maior é a influência do carvalho na bebida. Isso porque, como a superfície de contato da madeira com o líquido é maior em relação ao volume, aumenta também a quantidade de compostos liberados. Quanto mais velha for uma barrica, menos compostos ela transferirá ao vinho. Embora muitos vinhos costumem ser maturados em barricas novas, alguns enólogos preferem não usá-las, justamente em função do alto impacto que geram nos aromas e nas texturas do produto final. Utilizam barricas de segundo uso, por exemplo. As barricas com mais de três usos já são consideradas neutras, pois não transmitem mais compostos para o vinho de forma perceptível Hoje em dia as barricas que não são mais utilizadas na maturação de vinho são aproveitadas por cervejarias para conferir à bebida aromas de madeira.
Alternativas às barricas
Devido aos altos custos de uma barrica de carvalho, muitas vinícolas optam por alternativas economicamente mais viáveis para que seus vinhos ganhem a complexidade e os aromas da madeira sem sofrer grande impacto de custo. Uma delas é a utilização de “chips” (lascas) de carvalho. Nesse caso, os chips ou staves são colocados em contato com o vinho. Isso pode acontecer em diversas fases, desde a fermentação do mosto até quando o vinho já está pronto. É importante destacar que essa opção confere atributos aromáticos à bebida, mas não pode ser considerado um substituto total dos barris, já que a passagem do vinho por barricas de carvalho permite que moléculas de oxigênio penetrem na madeira e alcancem o vinho, ligando-se aos compostos de tanino mais pesados e fazendo-os precipitar no fundo do recipiente. Como resultado, o vinho tende a ficar mais redondo, aveludado e longevo.
Fotos: Seguin Moreau/Divulgação
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